8 de jan. de 2008



todas as fotos são do
Fosforeto




Umas poucas mudanças e o Humaitá Pra Peixe se transformou num festival de rock independente. Ou, pelo menos, em algo mais próximo do que geralmente se espera de um evento assim. É claro, as atrações emepebistas de sexta foram substituídas pelo folk-rock do Vanguart e o axé-rock (?) do Do Amor. Mais, numa repentina mudança climática, o sol foi embora e uma chuva forte caiu sobre Copacabana, sumindo com os banhistas/pedestres do dia anterior. Do lado de dentro da Sala Baden Powell, sumiram umas 200 pessoas (público estimado de 400, contra 600 do dia anterior). Entre elas, os tradicionais velhinhos do bairro, que haviam tido presença marcante na sexta e eram raros nesse segundo dia, e muitos dos vestidos floridos, as fãs de Roberta Sá. Por fim, um clássico de festival de rock, houve até problemas de som, uns apitos no começo do show do Vanguart.

As cadeiras (500 delas), porém, continuaram lá. Mas nada contra elas. Em entrevistas, público e artistas têm se declarado entusiastas da idéia de fazer um show para teatro, com público sentado. Comenta-se a nova relação da platéia com a apresentação, em relação à arena do Sérgio Porto, que está em reformas após incêndio, onde todas as 13 edições anteriores do Humaitá Pra Peixe aconteceram. Essa nova ordem ficou bastante explícita na noite de sábado. Do Amor, banda ainda razoavelmente desconhecida , apresentou seu show a um público curioso, mais observador e quieto de início. Mais tarde, em entrevista, o guitarrista Gabriel Bubu compararia a experiência a “um clipe dos anos oitenta em que há uma banda no palco e, na platéia, apenas múmias sentadas nas cadeiras”. (Você sabe que vídeo é esse? Deixe um comentário!) Só humor: no fim da apresentação ‘Do Amor, a platéia urrava e aplaudia como poucas múmias poderiam fazer.



Vanguart



E o momento mais emocionante da noite só poderia mesmo ter acontecido num teatro. Lá pela metade do show do Vanguart, todos os integrantes do grupo deixam o palco. O diminuto vocalista Helio Flanders está sozinho. Ele troca de violão, lentamente ajusta uma gaita ao seu pescoço, o público em silêncio, olha em volta: “assim, fico até sem-graça”, Helio diz. Ele canta “The Last Time I Saw You”, a faixa 13 do primeiro disco, homônimo, lançado em agosto passado via Outracoisa. Durante uns cinco minutos, Helio controla a platéia, exercitando seus dotes de contador de histórias, mudando o andamento, soprando a gaita, articulando ao máximo frases como “The 6th time I saw you | I was properly insane | From the whisky I had drunk | And the joint I had smoked” (algo como “da 6a. vez em que te vi | eu estava completamente louco | por causa do uísque que eu tinha bebido | e o baseado que eu tinha fumado”). E baixando o tom de sua voz e de seu violão até que o teatro todo ficasse em silêncio, a algaravia do corredor invadindo-o, um silêncio tenso que o vocalista quebraria com a gaita e o público com palmas e gritos, que tinham em si um certo alívio: o silêncio tinha acabado.

O show inteiro foi mais ou menos assim, razoavelmente silencioso, calmo, poucas coisas ditas ao microfone, uma canção, um breve intervalo, outra canção. Talvez seja isso o que levou um homem a gritar, já quase no fim da apresentação: “rock and roll!”, em tom de demanda. “Toca Raul”, alguém gritou logo depois, e “High School Musical”, pediu um gaiato. Fora esse último, os outros foram atendidos. Vanguart terminou seu show com a destrutiva “Semáforo” e, no bis, a banda tocou... Raul! A escolhida foi “Medo De Chuva”, que a o grupo tocou no programa Som Brasil, da Rede Globo, uma homenagem a Raul Seixas que deve ser reprisada hoje à 01:20 (na verdade, de hoje para amanhã). Por fim, o acelerado country-rock “Outlaw Blues”, uma versão para Bob Dylan.



Do Amor



Dylan certamente é uma escolha mais tradicional para versão que aquela que o Do Amor fez para encerrar sua apresentação: Tears For Fears (synth-pop radiofônico americano, duo clássico dos anos 80). Numa surpreendente versão de “Sowing The Seeds Of Love”, com direito a tradução simultânea para o português. Por que fazer essa versão? A banda elabora algumas teorias, de novo com uma referência a videoclipes. “A gente viu eles tocando isso ao vivo, já velhos, e eles pareciam muito o Ween (banda americana, alternativa, dos anos 80, influência no som ‘Do Amor)”. Marcelo Callado, Tears For Fears é uma influência pra vocês? O baterista responde, numa entrevista no camarim: “não! Eu nunca ouvi Tears For Fears, nunca gostei de Tears For Fears, mas quando sugeriram, fez todo o sentido e, quando a gente toca, faz mais sentido ainda”, se anima. O guitarrista Gabriel Bubu completa: “eu tinha uma tia relativamente hippie (?) que, quando viu esse clipe, numa fita de vídeo gravada da MTV americana, curtiu muito as animações”.



A conversa dá uma idéia do que é Do Amor: pós-modernismo, a banda pós-tropicalista em que tudo cabe, na qual se misturam elementos amplamente aceitos como “bons” (como o rock independente americano dos anos 90) e outros elementos que, numa banda qualquer, apareceriam apenas de forma irônica (como a axé music), mas aqui aparecem de forma... icônica (com significados pessoais). O também guitarrista Gustavo Benjão simplifica: “a gente não tem vergonha de se mostrar”.

No palco, Do Amor é a típica banda carioca: a postura descompromissada, o bom-humor, as barbas mal feitas e as bermudas. Mas um pouco mais incisiva, nos momentos em que, à Sonic Youth, o que importa é o barulho da guitarra e os vocais quase falados. No outro extremo, as influências de axé music e outros ritmos populares garantem momentos dançantes e divertidos como “Pepeu Baixou Em Mim”, que antecedou “‘Seeds Of Love” no fechamento do show.





+É hoje_ Então, anote no seu post-it: quarta, à 01:20 (madrugada de terça pra quarta). É quando a Rede Globo reprisa o programa Som BrasilRaul Seixas. A atração foi ao ar originalmente em agosto último e teve Anna Luisa, Móveis Coloniais de Acaju, Lobão e Vanguart tocando Raul.

+Nova_ Logo após “The Last Time I Saw You”, já a banda completa, o Vanguart apresentou uma nova música. É um blues razoavelmente tradicional e de andamento moderado, de quando em quando apimentado por sopros de gaita contrastando com um dedilhado delicado no teclado. Ou golpes violentos ao violão, a mão esquerda de Helio passeando pelo braço do instrumento. No refrão: “you know me so well, I know you as well” (algo como “você me conhece tão bem, eu te conheço também”, já com rima!)



+Cabotino 1_ Antes de apresentar a música nova, Helio disse que o Vanguart tinha feito muitos shows recentemente no Rio e que o amigo Pedro Acosta reclamava que nunca tinha música nova. Pronto, falei!

+Cabotino 2_ Algo que aprendi colando links em comunidades para promover este blog foi que o número de pessoas interessadas em saber o que é o Arquivo Acosta é três vezes menor que o número de pessoas interessadas no meu perfil do Orkut.

+Mosh_ Sabe quem causou no show ‘Do Amor, pulando do palco e fazendo moshes muito loucos? Pablo, de cinco anos, filho do baixista Ricardo Dias Gomes. Arazo. (Foto abaixo)



Marcadores: , , , ,

 

 

últimas


  • arquivoacosta@gmail.com

     

    desenho por caroline g.